Nos últimos meses presenciamos no Brasil e em diversos paí, uma série de manifestações públicas que tiveram como principais bandeiras o combate ao racismo e à violência policial, males que atingem milhões de jovens em todo mundo. O caso do americano Goerge Floyd, morto durante a abordagem de um agente policial na cidade americana de Minneapolis, no dia 25 de maio de 2020, aflorou as discussões recentes sobre o tema entre os norte-americanos.
Não é a primeira vez que ações como esta acontecem nos Estados Unidos, mas sempre que ela se repete, provoca comoção e revolta generalizadas. Após a morte de George Floyd, seguidos protestos foram observados em todo o país. Mesmo com as orientações de isolamento social, por conta da pandemia da Covid-19, milhares de americanos participaram de manifestações que pediam o fim do racismo e da violência policial.
Os protestos nos Estados Unidos resgataram uma frase que se tornou símbolo da luta contra o racismo: black lives matter, ou seja, vidas negras importam! A frase estampada em cartazes, camisetas, hashtags na internet e outros materiais, ganhou projeção internacional e provocou uma onda de reações em outros países, inclusive no Brasil.
Cabe destacar que o estopim para a revolta dos americanos, no caso de Floyd, foi a desproporcionalidade da força utilizada para imobilizá-lo. Na ocasião, o agente policial deixou a vítima em situação totalmente desconfortável, com medidas que dificultaram sua mobilidade, respiração e o levaram a morte. As imagens da abordagem circularam o mundo e reacenderam discussões históricas sobre racismo e violência contra a população negra.
No Brasil, a campanha “vidas negras importam”, mobilizou milhares de pessoas por meio das redes sociais e, posteriormente, nas ruas. Artistas, políticos, lideranças populares e diversos outros agentes sociais, manifestaram sua indignação diante do aumento da violência contra os negros. Na ocasião, foram lembrados os casos de jovens negros vítimas da ação policial no Brasil, tais como: João Pedro, Christian e Guilherme, ambos de São Paulo, além de João Pedro, do Rio de Janeiro.
João Pedro, 14 anos, foi alvejado com tiros durante uma operação da polícia, enquanto brincava com amigos dentro de casa, em São Gonçalo/RJ. Christian Silveira, 17 anos, foi assassinado por policiais militares em Mogi das Cruzes/SP. Guilherme, 15 anos, foi morto por policiais por ter, supostamente, sido confundido com um suspeito que estava sendo procurado por assalto, em São Paulo/SP. Essas e outras vítimas fazem parte de um cenário desastroso no Brasil, que evidencia que os jovens negros são as maiores vítimas de assassinatos em nosso país.
O Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2019, p. 59), publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, apresenta dados que revelam que “os jovens até os 29 anos representam 54,8% das vítimas de homicídio no Brasil”. Se considerarmos os dados das mortes causadas pela ação policial, os jovens nesta faixa etária representam 78,5% do total de vítimas de “intervenções policiais com resultado morte”. Os dados revelam também que 33,6% das vítimas jovens está na faixa etária entre 20 e 24 anos.
Como se não bastasse o cenário caótico que mostra os jovens como maiores vítimas da violência no Brasil, inclusive violência policial, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2019, p. 59) constata ainda, que “os negros são 75,4% dos mortos pela polícia”. Segundo a análise do material, as vítimas são basicamente: jovens, negros, do sexo masculino, com baixa escolaridade e moradores das periferias.
Devemos compreender que esses dados não constituem apenas números estatísticos, mas representam uma dura realidade enfrentada por milhares de famílias em todo o Brasil. Estamos falando de mães e pais que veem seus filhos saírem de casa sem a certeza do retorno; de estudantes e trabalhadores que lutam para mudar suas condições de vida e não fazerem parte dessas estatísticas; de planos, projetos e futuros de milhares de jovens sonhadores que vivem nas periferias brasileiras.
Combater a violência, o racismo e todas as formas de discriminação étnico-racial, não deve ser uma pauta exclusiva do movimento negro, pelo contrário, deveria ser um debate presente em diversos outros espaços de participação social. O racismo estrutural que carregamos como herança, presente em atitudes e ações do dia a dia, contribui para que se perpetue a falsa narrativa de inferioridade da população negra em relação aos brancos.
Essa realidade pode ser observada também em outros sujeitos historicamente estigmatizados, como povos indígenas, migrantes, pessoas em situação de rua, de classes sociais mais baixas entre outros. Por isso, é de suma importância fazer com que esse debate não fique apenas no ambiente virtual, mas seja inserido na esfera pública, ocupando espaço nas escolas, universidades, igrejas e demais instituições.
A Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu a década afrodescendente (2015 – 2024), tendo como um dos objetivos que a história afrodescendente seja cada vez mais reconhecida e valorizada. A temática deverá ser abordada por meio de publicações, pesquisas, ações institucionais e outras atividades de mobilização, difundindo conhecimentos e iniciativas que dialoguem sobre a realidade da população negra em diferentes espaços.
Para saber mais informações sobre a década afrodescendente, acesse o site oficial e colabore com essa iniciativa. Esperemos que, num futuro próximo, a população negra passe a liderar estatísticas bem diferentes das de hoje. Que os jovens tenham capacidade de sonhar, planejar e lutar pelo direito de escreverem suas próprias histórias de vida, longe dos males da violência, racismo e discriminação.
Por Rodrigo Fadul
Especialista do Observatório das Juventudes - PUCPR
Foto: Unplash